
Em julgamento na 5ª turma do
Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF1), por unanimidade, foi
acatada a apelação do Ministério Público Federal (MPF), que pedia a
nulidade do acordo de cooperação técnica firmado entre a Eletrobrás e as
empresas Andrade Gutierrez, Odebrecht e Camargo Corrêa para realizar os
estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental das obras da
Usina Belo Monte.
O pedido havia sido negado pela 9ª Vara da Justiça
Federal no Pará. Além da nulidade, o recurso exigia a indenização por
perdas e danos, considerando o alto custo dos estudos previstos. Com a decisão do Tribunal, fica anulado o acordo feito em 2005,
sem licitação, entre a Eletrobrás e as empreiteiras Andrade Gutierrez,
Odebrecht e Camargo Corrêa para a realização dos estudos de Belo Monte.
As empresas e o governo ainda têm direito a recurso, mas, ao fim do
processo, elas podem ser obrigadas a devolver o dinheiro repassado para
os estudos e ainda se retirar da obra da usina, que só será concluída em
2019. “Vamos procurar recuperar para os cofres públicos o dinheiro pago
pela Eletrobrás a essas empreiteiras”, diz o procurador regional da
República Felício Pontes, autor da apelação julgada ontem em Brasília. O
valor total dos estudos de Belo Monte nunca foi divulgado, mas pode
passar de R$ 10 milhões.
A aliança entre a Eletrobrás e as empreiteiras
pode ter influenciado de maneira determinante o resultado do leilão de
Belo Monte, ocorrido cinco anos depois da assinatura do acordo, em 2010.
As empreiteiras se retiraram da concorrência e ficaram apenas com a
fatia segura do projeto da usina, as obras de construção civil, deixando
possíveis riscos para os sócios da Norte Energia S.A.
“O ajuste (acordo
de cooperação técnica) permitiu que a administração concorresse
indevidamente para o favorecimento das três empreiteiras, que obtiveram
informações privilegiadas, de modo a interferirem e condicionarem, de
forma irregular, o comportamento de possíveis competidores”, disse a
procuradora regional da República Eliana Torelly, que sustentou a
posição do MPF diante do Tribunal.
Os desembargadores Néviton Guedes, Souza Prudente e
Carlos Moreira Alves concordaram com os argumentos do MPF e ordenaram a
anulação do acordo. A decisão, além das consequências para as
empreiteiras envolvidas em Belo Monte, pode ter repercussões em novos
projetos de aproveitamento hidrelétrico, já que a partir desse
precedente, serão necessárias licitações para confecção de estudos de
impacto ambiental. As falhas e lacunas nos estudos realizados por
empreiteiras que são diretamente interessadas nas obras têm graves
conflitos socioambientais nas regiões atingidas por barragens.
Entenda o processo judicial - A
ação do MPF pedindo a nulidade do acordo de cooperação técnica e de
todos os atos dele decorrentes data de 2007. A finalidade do acordo era a
conclusão dos estudos de viabilidade técnica, econômica e ambiental,
que compreendia a elaboração de um novo Estudo de Impacto Ambiental
(EIA) e Relatório de Impacto Ambiental (RIMA), revisão do inventário do
potencial hidro energético da bacia do rio Xingu, estudo de natureza
antropológica, avaliação ambiental integrada da bacia e respectivo
Programa de Desenvolvimento Regional Sustentável, além das adequações
necessárias aos estudos de engenharia com base nos novos estudos
realizados com a celebração do Acordo.
Segundo o Ministério Público, o acordo de
cooperação técnica é nulo por dispensa indevida de licitação,
injustificável restrição à publicidade de instrumento público, e criação
ilícita de vantagem competitiva em favor das empresas privadas que
participaram do acordo, depois contratadas para realizar as obras de
Belo Monte, que tiveram um custo total de R$ 28 bilhões.
O juiz da 9ª
Vara Federal do Pará julgou os pedidos do MPF improcedentes. Para ele a
licitação poderia ser dispensada por se tratar de convênio e não
contrato administrativo, a questão da restrição à publicidade teria sido
resolvida com um termo aditivo que excluía a cláusula de
confidencialidade, além de não reconhecer o privilégio de informações às
empresas participantes do convênio.
Após a sentença desfavorável, o MPF do Pará
recorreu ao TRF1. Para o procurador regional da República, Felício
Pontes Jr., não há que se falar em convênio administrativo no caso do
acordo de cooperação técnica entre a Eletrobrás e as empresas privadas.
“O convênio pressupõe pessoas atuando em cooperação ao fim comum de
ambas. Claro está que o convênio deve ser realizado entre entes
públicos. E, ainda que seja feito com um ente privado, somente poderá
ser firmado com aqueles sem fins lucrativos, o que não é o caso. A
licitação era necessária”, explica o procurador.
Outro ponto levantado pelo MPF foi o fato das
empresas que celebraram o Acordo terem sido contratadas para construção
da usina Belo Monte, tendo sido privilegiadas com as informações obtidas
nos estudos realizados por meio de Acordo.
“Ficaram na melhor das posições. É que, diante de
tantas incertezas sobre a UHE Belo Monte, sua atuação se circunscreve à
construção da obra. Se ela vai ser lucrativa ou não, pouco importa. Para
cada metro cúbico de concreto que colocarem, vão receber pelo trabalho.
Essa constatação irrefutável é suficiente para demonstrar que o
'ajuste' em estudo foi suficiente para privilegiar as empreiteiras com
informações que a fizeram rechaçar o leilão (duas delas pelo menos), e
se apresentarem como construtoras da obra apenas”, acrescenta Felício
Pontes.
A ação contra o acordo entre Eletrobrás, Andrade
Gutierrez, Camargo Corrêa e Odebrecht é uma das 26 ações judiciais que o
MPF move apontando irregularidades em Belo Monte. Apenas dois desses
processos já transitaram em julgado. Fonte: MPF Pará
Tabela com todos os processos sobre Belo Monte.
Processo nº 003843-98.2007.4.01.3900
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